BOCEJA CANSADO DE ESTAR
Boceja
cansado de estar
Sentado
sobre o algodão
Colhido
pelos escravos
Rói
os dedos para matar
Os
ponteiros do tédio
Cruza
as pernas cheias
De
veias inúteis e entupidas
Vasculha
no ecrã sonhos
Que
o corpo foi lá longe
Esfrega
os cílios mortos
Por
se deitarem num divã
Nunca
leu um romance
E
indica a rota do número
Escuta
o gás que se perde
Pela
estrada e pelo céu
Gira
o dorso para não ver
Os
acúleos das palmeiras
Tosse
e propaga um sismo
Pelo
ar pesado como chumbo
Há
um torpor de coração
Anunciando
grito de morte
Uma
criança agarra a caneta
Como
homem agarra a pedra
Mais
leve na álea da vinha
E
pede o tempo neste instante
Porque
o tempo tem vida
Pernas
diluem-se de súbito
Nos
nodos de uma palmeira
Duas
penas negras desenham
Uma
linha pelo céu ocre
Um
funeral marcha timidamente
Como
se não aceitasse o fim
A
minha bicicleta vai cantar
Um
país novo em folha
Porque
este tem a cova aberta
Uma
pega derrapa na clarabóia
E
grasna para os livros enterrados
Nas
estantes absortas da biblioteca
As
unhas verdes dos ratos bailam
Como
as pontas das palmeiras
Pela
calçada dura e percuciente
E
roem a luz que resta do dia
Desce
sorrateiramente o ar escuro
O
horizonte abre-se à minha frente
A
bicicleta não tem saída
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