Para quem no seu primeiro livro desenhou uma «Arquitectura
do Silêncio» não deixa de surpreender esta «Contramina» que transporta uma fala
múltipla, diversa e em dispersão como um teatro. Não o edifício mas a peça onde
os autores surgem no palco ao ritmo da marcação do encenador. Que é, neste caso,
o poeta. Existem, nesta sucessão de falas, dois mundos em paralelo. O mundo
mineral - «não existe milagre nem metáfora, no eixo do planeta, a presença
nasce de um encontro mineral» - ao lado do mundo sentimental: «uma figura atravessa a imperfeição da luz. nela terá de entrar, contudo, um líquido
escuro, talvez mesmo a espiral governe (mantenha em movimento) o motor que
comove a existência». Entre estes dois mundos, a linguagem procura uma ordem:
«há uma face virada a nascente, esperando
o centro da noite, o interior da fala. mudo as palavras mas não consigo ordenar
as letras que compõem o universo».
A vida e o Mundo podem trazer ao nosso olhar um mapa de
angústia: «o adobe desfaz-se com o gelo. a casa dissolve a pedra, o lençol, o
livro, a legenda e a lembrança – onde vemos aquele ramo segurando a nossa
angústia». Ou um mapa da alegria de nascer: «recebemos o pão, o segredo da
água, nas linhas do edifício. desenhamos na mão a planta, a raiz da planta que atravessa o coração. A cidade nasce». Outras vezes a vida e o Mundo juntam dois
universos opostos: o físico e o moral, «moléculas e memórias» como afirma o
poema: «o sal conservou a imagem de uma mulher corroendo a saudade. seccionou o
silêncio para nele depositar a fonte da tristeza».
As falas sucessivas constroem uma filosofia («morremos – e só assim conseguimos esperar»), uma moral («lutamos contra o tempo para que o tempo nos conforte»), uma verdade («nenhuma palavra corrige a escrita anterior») e uma conclusão: «todos os seres nos pertencem e nos modificam». Neste livro o corpo projecta o Mundo como sua imagem: «sangra-se o poema. Não sobrevive se a água não circula pelas veias. setenta por cento do poema é apenas água (salgada), sal da terra. a mina sustenta todas as formas de vida que povoam e elevam a existência». Uma nota final para o título – um dos sentidos da palavra «contramina» em verbo é desfazer e desmontar uma traição ou um engano. Ao dedicar o livro a Carlos Garcia de Castro e Maria Guadalupe Alexandre com homenagem a Judite Peres e Raul Cóias Dias, o autor mostra como a Poesia é sempre e também um novo trabalho sobre a linguagem - afinal matéria provisória mas que existe, que funciona e que permanece.
As falas sucessivas constroem uma filosofia («morremos – e só assim conseguimos esperar»), uma moral («lutamos contra o tempo para que o tempo nos conforte»), uma verdade («nenhuma palavra corrige a escrita anterior») e uma conclusão: «todos os seres nos pertencem e nos modificam». Neste livro o corpo projecta o Mundo como sua imagem: «sangra-se o poema. Não sobrevive se a água não circula pelas veias. setenta por cento do poema é apenas água (salgada), sal da terra. a mina sustenta todas as formas de vida que povoam e elevam a existência». Uma nota final para o título – um dos sentidos da palavra «contramina» em verbo é desfazer e desmontar uma traição ou um engano. Ao dedicar o livro a Carlos Garcia de Castro e Maria Guadalupe Alexandre com homenagem a Judite Peres e Raul Cóias Dias, o autor mostra como a Poesia é sempre e também um novo trabalho sobre a linguagem - afinal matéria provisória mas que existe, que funciona e que permanece.
(Editora: Licorne
Grafismo: Isabel Bilro
Posfácio: António Cândido Franco)
José do Carmo Francisco
Grafismo: Isabel Bilro
Posfácio: António Cândido Franco)
José do Carmo Francisco
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